A Revolução da Cruz
- ocatecumeno

- 26 de out. de 2023
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Atualizado: 30 de mai.
Revolução. Quando ouvimos esta palavra, nosso imaginário nos conduz a diversas revoluções que ocorreram na história humana, em grandes mudanças que impactaram de maneira ímpar toda sociedade de uma região e até do mundo inteiro. Uma revolução é marcada pela total indignação dos revolucionários quanto ao atual sistema político, social ou de poder em que estão inseridos. Apelam para as massas trazendo à memória delas as injustiças vividas ali e que precisam ser transformadas com urgência. As revoluções transformam não somente aspectos políticos, sociais e de poder, mas também o modo de pensar de um povo. Aspectos mais profundos como moral, religião e filosofia são os primeiros a serem modificados pois são o que gera o combustível para uma nova sociedade. Podemos dizer que este seria o tripé de toda sociedade humana, o que forma a base interior para que as ações dos indivíduos venham ao exterior e transformem a partir disto o mundo à sua frente moldando assim o sistema político, social e de poder vigente seja na mudança total deles ou na manutenção deles porém agora com uma nova mentalidade que altera a essência de como funcionam tais sistemas.
Na escola estudamos sobre diversas revoluções e ao longo da vida nos vem ao saber diversas outras que ainda não estudamos. Geralmente são marcadas por períodos violentos e derramamento de sangue, devido uma mudança radical que é proposta pelos revolucionários que combatem o “mundo” atual visando um novo “mundo” para o futuro. Essa violência parte de todos os envolvidos, tanto do atual poder que procura se firmar no domínio quanto dos manifestantes que desejam a morte daqueles que de alguma maneira possam impedir a revolução. No meio desses grupos está a sociedade com indivíduos que tomam ou não algum partido.
Vamos falar um pouco sobre três das quais considero as principais revoluções da história humana e demonstrarei o porquê dessa percepção.
Revolução Francesa: ocorrida entre 1789 e 1799, por vezes nos vêm ao imaginário uma linda luta pela liberdade cheia de flores e de grandes heróis. Porém a realidade é muito diferente daquilo que está no imaginário das massas. Seus revolucionários assassinaram números que variam de 18 mil a 40 mil vítimas que apresentavam, segundo os critérios deles, risco aos ideais da nova república de igualdade, liberdade e fraternidade que estavam construindo. Sendo o principal método de execução legal a guilhotina, instrumento criado por um médico francês com o fim de executar pessoas, uma “máquina de cortar gente”. Para se ter uma ideia da barbaridade e do padrão sistemático de violência praticado, neste curto período de 10 anos a amada revolução do homem moderno matou mais do que as inquisições católicas em 400 anos! De acordo com historiadores como Henry Kamen, Régine Pernoud, Edward Peters, Jacques Le Goff, Agostino Borromeu e o compilado sobre o tema de diversos historiadores que estudaram os documentos dos julgamentos/processos da inquisição L’Inquisizione. Sendo que a maior parte desses nomes nem são cristãos. Aquela que prometia um novo mundo aqui na terra, livre da opressão da religião e do rei com o lema acima citado, se tornou terror e opressão muito maiores do que os opressores que almejavam combater. Em outro artigo falaremos mais profundamente sobre as inquisições. Revoltados contra o rei, se tornaram mais sangrentos e impiedosos que o próprio rei. Dispostos a destruir tudo e todos, com extremo ódio contra seus opositores, para que sua civilização ideal fosse implantada. Não foi assim também nas demais revoluções modernas e pós modernas? Cuba, Rússia, China, Camboja entre outras. Não podemos deixar de citar a revolução que possibilitou as demais revoluções da era moderna, os franceses desejavam derrubar o rei. Seus progenitores desejavam derrubar a Igreja.
Revolução Protestante: apesar de conhecida como Reforma, é muito mais adequado nomear como Revolução. Afinal alterou radicalmente o pensamento e a estrutura social de um continente inteiro. Com as raízes no renascentismo que colocava o homem como fim das coisas e negavam a Deus em detrimento de antigos escritos pagãos ou até somente pelo humanismo que valorizava ao extremo o prazer do homem, uma espécie de hedonismo. Herdando este espírito, os reformadores passam a combater (tal como os renascentistas) a Igreja e começam a colocar o fim das coisas em um livro, as Escrituras Sagradas. Porém, na realidade estavam colocando o fim em si mesmo, afinal era o próprio indivíduo em particular que definia o que as Escrituras diziam, eles mesmos interpretavam e decidiam qual era a verdade. Auto declarando a si próprios como homens iluminados pelo Espírito Santo para a correta interpretação. Se inicia uma guerra contra a Igreja que para eles era o maior mal do mundo. Cooptaram reis e príncipes de diversas regiões que, vislumbrados com a possibilidade de adquirir maior poder e não terem mais necessidade de se sujeitar a moral católica, abraçaram as novas doutrinas que iam surgindo e que proclamavam a libertação da humanidade do papado e da Igreja. Lutero prega o rei local como digno de ser o sacerdote da igreja em seu país. Com a disseminação de várias interpretações diferentes das Escrituras e de doutrinas, a Europa se torna um caos e diversos conflitos começam a surgir por toda parte. Reis que se rebelaram contra a Igreja Católica passaram a matar o próprio povo para que se tornassem protestantes como o rei o era, começa aí a monarquia absolutista, onde o rei era o poder espiritual e temporal ao mesmo tempo. Que viria a ser a principal revolta dos franceses tempo depois. Em conflitos na região da atual Alemanha morreram cerca de 100 mil pessoas, por toda a Europa reis tomavam posses da Igreja (além de templos, também casas e terras de monges que eram utilizadas para ensino e cultivo comunitário para os mais necessitados). Claro que haviam injustiças na sociedade anterior, todavia as injustiças produzidas pela sociedade que começava a se formar eram ainda maiores. O rei inglês Henrique VIII, fundador e primeiro “sumo sacerdote” da igreja anglicana, assassinou a própria esposa por não lhe ter dado filho homem. Perseguiu, confiscou posses e matou aqueles que não o reconheceram como chefe máximo da igreja e da nova religião na Inglaterra. A reforma foi marcada por sangue de inocentes por ação direta dos reformadores e seus apoiadores, até entre eles mesmos, os anabatistas por exemplo foram perseguidos assim como os puritanos pelos próprios protestantes que utilizavam o mesmo meio de interpretação que eles, a livre interpretação das Escrituras. Novamente, uma revolta com muita violência e derramamento de sangue do outro, do próximo, do monstruoso inimigo a ser combatido. Mas os revolucionários, como de costume, se tornam ainda piores que seus pretensos algozes. Vide a teologia da prosperidade e de um paraíso aqui na terra, como tentaram construir os anabatistas com sociedades em que se dividia até mesmo as mulheres (não me pergunte como eles interpretaram isso nas Escrituras, mas bom, segundo eles foi o Espírito Santo). A cidade tomada pelos anabatistas mais conhecida foi a de Munster, na atual Alemanha. Ou uma sociedade puritana com leis severas como na Suíça de Calvino onde se legislava até sobre o vestuário. A famosa caça às bruxas, que foi um fenômeno que se deu nas regiões protestantes. Ação que insistem em colocar na conta da Igreja, mas é de cunho protestante que adquiriram diversas superstições quanto a bruxaria. Não que ela não exista, mas certamente não era a forma que a Igreja se opunha a ela. A prática de mentir e difamar a Igreja Católica é corriqueira até hoje, pois herdamos toda uma bagagem de calúnias que foram se perpetuando nos contos populares. Por exemplo, dizendo que ela escondeu o conhecimento, quando foi ela quem preservou os escritos da maioria dos autores da antiguidade a qual temos acesso hoje.
Em toda história, só conheço uma “revolução” em que os revolucionários não derramaram o sangue de ninguém. Não praticaram a violência contra o próximo, não caluniaram seus algozes, não odiaram, não praticaram coisas ainda mais terríveis que seus ditos ofensores. Falaremos dela agora.
Revolução da Cruz: após a ascensão de Jesus Cristo aos céus, os apóstolos levam as boas novas do evangelho a todo o mundo como o Mestre os havia ordenado (Mateus 28.19-20). Na era do Império Romano. Na cidade de Roma o apóstolo São Pedro lidera a Igreja e por todo o território romano os cristãos começam a ser perseguidos e mortos pela fé que professavam em Jesus, pois para o império eles representavam um grande perigo que poderia colocar abaixo a religião e sociedade romana. Já que se recusavam a prestar culto cívico ao César como divindade. Estes cristãos queriam tão somente levar a verdade, o amor, a salvação, Cristo Jesus a todos os homens. E por amor a Deus e ao próximo viviam e morriam. Foram milhares os mártires nos primeiros séculos do cristianismo, os quais jamais agiram com violência e ódio contra o próximo. Receberam no próprio corpo a injustiça, por amar a verdade e levar Cristo à humanidade. Este foi também o destino dos apóstolos, martirizados, assassinados por não negarem o Senhor. Mudaram toda uma sociedade, um Império colossal, sem violentar ninguém, sem odiar ninguém. Apenas amando a Deus e o próximo, entregando a própria vida pela salvação das almas. Venceram o império Romano dessa maneira, pregando e vivendo o evangelho como Cristo ensinou, construindo assim a civilização ocidental cristã infelizmente maculada hoje pelas revoluções vindouras que desprezam o evangelho e a Igreja que eles nos deixaram com tanto sacrifício.
O título deste artigo foi inspirado em um capítulo do livro Igreja dos Apóstolos e Mártires do autor Daniel Rops, capítulo que possui este mesmo título “A Revolução da Cruz”. Em meu entendimento, uma palavra má e, ao mesmo tempo, bem empregada. Explico, revolução traz uma carga de indignação com a opressão de um governo vigente e as injustiças em uma sociedade sendo um dos atos principais para mudar isso a violência, a morte dos opositores da nova visão de mundo. Por outro lado, é genial, pois demonstra com sutileza mas total clareza quão falho e pobre é o coração do homem perante a realidade da Cruz, que procura transformar unicamente às coisas terrenas sendo a banalização do transcendente uma marca das revoluções (principalmente na era moderna). Diferentemente, a Cruz nos fala do sacrifício de si mesmo, na mortificação do próprio eu tendo seu fim último as coisas do alto, não somente nas coisas do mundo e não com os olhos no mundo, mas antes de tudo com os olhos em Cristo Nosso Senhor que padeceu em uma cruz.
No evangelho segundo São Mateus, capítulo 16, Jesus nos convida a O seguir tomando a nossa própria cruz ao negar a si mesmo. Assim foi a Revolução da Cruz, homens e mulheres que se tornaram mártires por manifestar o amor de Nosso Salvador ao mundo, um mundo que será permeado por injustiças e males sempre em qualquer espaço de tempo. Mas o mundo que os revolucionários da Cruz desejavam alcançar e conduzir outros a ele, não se realiza aqui na Terra, não tem por fim as coisas desta vida. Este mundo se realiza nos Céus, no amor à Santíssima Trindade. Estes mártires jamais desejaram a morte ou odiaram seus algozes, jamais derramaram sangue que não fosse o seu próprio sangue, imitando até mesmo no sofrer o sacrifício do Cordeiro. Tudo em obediência ao Mestre, por amor daqueles que não conheciam o Amor, padeceram males unicamente em seus próprios corpos, de maneira alguma em outro. Para que o outro, sim, aquele mesmo algoz que lhes infligiram castigos e mortes terríveis, este outro pudesse receber o Senhor Jesus. Para conduzir o mundo à salvação eterna, não para nos conduzir simplesmente às coisas pequenas desta vida, se comparadas com a realidade da eternidade com Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo.
Que os santos mártires roguem por nós para que tenhamos fortaleza e grandeza, como eles que mesmo em face da morte amaram o próximo e a Cristo de todo coração. Amém.
Louvado seja o Senhor da Cruz!






Amém!