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Judas e o problema das ideologias

  • Foto do escritor: ocatecumeno
    ocatecumeno
  • 30 de mai.
  • 6 min de leitura

Em nosso tempo há diversas ideologias e, naturalmente, os indivíduos se aproximam daquelas que  mais lhe convencem o intelecto ou aquela que apetece aos seus sentidos. Para compreender melhor, vejamos algumas definições de ideologia:

  • Antoine Destutt de Tracy, filósofo francês, é quem dá origem ao termo ideologia - ciência das ideias - em 1796. Propondo um estudo racional das ideias e suas origens que são fruto das percepções sensoriais do ser humano, todavia ao longo do tempo a palavra adquiriu outras definições.


  • Para alguns, como Napoleão Bonaparte, os ideólogos eram pessoas desconectadas da realidade prática. Sendo inútil na prática especialmente na administração pública e na guerra.


  • Karl Marx e Engels utilizaram o termo também com sentido crítico, como uma forma de falsa consciência, um conjunto de ideias que mascaravam as intenções da classe dominante se tornando uma ferramenta de dominação. Ao mesmo tempo, com sentido positivo quando se trata da ideologia da classe dominada. Ideologia burguesa versus ideologia proletária, focando no campo econômico das ideias.


  • Mais a frente no século XX, Antonio Gramsci, introduz a ideia de hegemonia cultural onde os dominadores moldam a cultura, os valores, as ideias. Podendo ser também um meio de resistência para os dominados.


  • Louis Althusser entende que a ideologia molda a forma como as pessoas raciocinam e se veem no mundo, uma cosmovisão.


  • Karl Mannheim separa em dois conceitos: ideologia parcial (quando a realidade é distorcida para o benefício de um grupo) e ideologia total (quando a visão de mundo está profundamente enraizada e é inconsciente). Entende que, aplicando na história, sempre há aqueles que desejam manter as coisas como estão e aqueles que desejam mudanças. Uma ideologia que busca a conservação e outra que busca a mudança. Sendo que a adesão a primeira tende a produzir ideologias e a segunda tende a produzir utopias. Porém advoga que adotar uma ideologia ou utopia limita a compreensão da realidade em relação aos diversos pensamentos, grupos e fatores existentes.


Podemos concluir assim que a ideologia é um conjunto de convicções filosóficas, sociais, políticas, religiosas, éticas, etc de um indivíduo ou grupo. Mas onde Judas Iscariotes entra nessa história? No evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João 12, 4-6 Mas Judas Iscariotes, um dos seus discípulos, aquele que o havia de trair, disse: “Por que não se vendeu este bálsamo por trezentos denários e não se deu aos pobres?” Dizia isso não porque ele se interessasse pelos pobres, mas porque era ladrão e, tendo a bolsa, furtava o que nela lançavam. Sem dúvidas, Judas amava o dinheiro, tanto que não somente o desejava, mas o roubava do próprio Cristo. Porém, sendo mais benevolente para com ele, vamos procurar entender o que se passava na cabeça deste homem.


O povo judeu aguardava o Messias, aquele que viria para os libertar da opressão dos inimigos e estabelecer um reinado eterno de Israel, que subjugaria todos os povos a começar pelos romanos que os oprimia. Assim, todos os povos saberiam que verdadeiro é o Deus dos judeus e que eles eram seus eleitos. Não somente Judas, mas grande parte de Israel, incluindo os discípulos, pensavam que o Messias seria um rei guerreiro que realizaria esse grande feito político e militar. Apesar do próprio Cristo declarar “o meu reino não é deste mundo” (São João 18, 36) nem mesmo os discípulos haviam entendido com clareza essa realidade até a vinda do Espírito Santo em Pentecostes que lhes deu o verdadeiro entendimento do Evangelho de Jesus. O nome Judas era comum e venerado nessa época, devido a um herói recente na história de Israel, apelidado de Macabeus “Martelo”. Judas Macabeus foi um sacerdote que liderou a revolta judaica contra o Império Selêucida em 164 a.C, ele obteve êxito restabelecendo o culto judaico e a independência de seu povo. Assim, Judas Iscariotes, possuindo o mesmo nome, tinha convicção de que o Messias seria ainda maior que Macabeus na batalha. Ora, Iscariotes não odiava Jesus, presenciou e viveu maravilhas através dele. Todavia, não o conhecia verdadeiramente.


Ainda na esperança do Rei Guerreiro, Judas decide dar uma ajuda para Jesus o entregando para a prisão, a fim de que isso desencadeasse a tão desejada batalha que traria glória a seu povo. A série The Chosen retrata com maestria esse provável pensamento do traidor. Judas vai até os chefes dos sacerdotes e vende a Cristo por trinta moedas de prata, o preço de um escravo. O sinal que combina para terem certeza de estarem prendendo Jesus era um beijo no rosto. Judas se aproxima de Cristo e o beija dizendo “Mestre”, Nosso Senhor corresponde com ternura dizendo “amigo, a que viestes?” Em seguida os guardas prenderam Jesus. Após a condenação de Cristo, Judas caiu em profundo arrependimento e foi ter com os sacerdotes para devolver as moedas, talvez na esperança de soltar o Homem de “sangue inocente” (São Mateus 27, 3-4). Rejeitado pelos sacerdotes, sem nenhuma esperança, com profundo pesar pela traição, pensando ter impedido a vitória do Messias de Israel e o levado a derrota, o desespero o leva ao auto extermínio.


Não havia ódio em seu coração para com Cristo, se houvesse não se importaria com a traição ou com sua morte. Judas tinha certeza que Jesus era mesmo o Messias, por isso sua alma caiu em tão grande abismo. Judas foi zeloso para com a interpretação da profecia que ele recebeu, na qual foi educado e cresceu com esperança de sua realização. Ali estava por anos o Messias a sua frente, caminhou com Jesus, conversou com Jesus, ouviu seus ensinamentos, sua sabedoria, sua autoridade, seu poder. Mas não o traiu por não o amar. pelo contrário, Judas amou Jesus. Mas o Jesus que ele amava só existia em sua própria ideologia. Judas traiu Jesus porque Ele não era como ele desejava que fosse. Porque Cristo não era o seu tão amado Rei Guerreiro.


Eis a conexão de Judas Iscariotes com as ideologias, tal como Judas as ideologias podem e por muitas vezes têm causas, desejos e objetivos nobres, mas se encontram no mesmo erro de Judas. Elas rejeitam Jesus. Mas como assim, rejeitam Jesus? Simples, rejeitando a verdade. Nosso Senhor diz “Eu sou a Verdade, o Caminho e a Vida, ninguém vem ao Pai senão por mim” (São Mateus 14, 6). Os autores citados acima, em um apanhado geral, percebem a ideologia como a forma de raciocinar e de enxergar o mundo de um indivíduo ou grupo. Mas em nenhum momento os sentidos garantem, necessariamente, o alcance da realidade. Karl Mannheim muito bem conclui que as ideologias e utopias limitam a compreensão da realidade por não permitir que a mente alcance além das suas predefinições.


Trazendo para o nosso tempo, é como o direitista que enxerga qualquer um que se desvie de sua ideologia como um comunista ou como um esquerdista que enxerga qualquer um que se desvie de sua ideologia como um facista/extrema direita. É como um cientista que acredita poder estudar algo imaterial como alma, pensamentos e sentimentos através da matéria (a matéria é o único objeto possível de estudo científico moderno, as coisas imateriais cabem à filosofia). As ideologias impedem a percepção adequada da realidade, pois limita o próprio intelecto humano. Não seria o catolicismo também uma ideologia e, portanto, igualmente cairia nesse mesmo dilema? Em um artigo desse mesmo blog tratamos sobre a questão da VERDADE, para melhor entender recomendo a leitura. Sendo Cristo a Verdade, Deus feito Homem, se afasta das ideologias aquele que recebe Jesus. Mas não em qualquer lugar, pois Cristo escolheu através de quem, onde e como quer ser conhecido: no Magistério, na Tradição Apostólica e nas Escrituras. Resumindo, na Santa Igreja Católica. Nela, Cristo se dá a conhecer da maneira mais perfeita que o homem pode alcançar.


Em Jesus somos livres não simplesmente das ideologias, mas daquilo que verdadeiramente nos oprime e condena, livres do pecado. O pecado nos ofusca a Verdade, nos impede de nos aproximarmos do Salvador que nos faz livres para o reino eterno que não se dá nesse mundo, mas no céu. As ideologias rejeitam Jesus porque nenhuma delas enxerga que Ele é a Verdade e única direção digna de nossas vidas. Não permitamos nos cegar por nossas próprias ideias ou convicções, mas aceitemos Jesus, aceitemos quem Ele é. Não o que esperamos que seja a verdade, não como esperamos que Ele seja. Os filósofos escolásticos dizem “a verdade é a adequação da mente à realidade”, podemos ir mais além e dizer “a realidade é a adequação da mente a Jesus Cristo”; pois dEle, por Ele e para Ele são todas as coisas. Ele é a Verdade, tudo só existe por ser sustentado por Ele e nada mais. Perceba, são as ideologias que precisam se moldar a Jesus Cristo, não Cristo que deve ser moldado por ela.


Mesmo o traindo e preferindo nossas próprias verdades e convicções; Cristo, sempre dócil, nos chama de amigo e nos convida ao verdadeiro arrependimento para nos reconciliarmos e vivermos com Ele.

Que nossas mentes e corações estejam voltadas com esperança e confiança em Jesus, por quem Ele é, o grande Eu Sou, Luz da Luz, Deus Verdadeiro de Deus Verdadeiro. Essa Verdade pela graça do Espírito Santo convença nossos corações com a poderosa intercessão da Virgem Maria e São José seu esposo. Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo! Viva Cristo Rei! Caminho, Verdade e Vida!


“O homem que deseja a verdade, encontra-se com Cristo” Santo Agostinho de Hipona



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